terça-feira, 12 de janeiro de 2010

AVA A TAR..

Cruzeiro Mirim  é uma  pacata cidade  no interior de Minas.
Encravada entre  verdes montanhas, não recebe  sinal de celular. O  computador então, é "avis rara" nas residências. É, praticamente, uma cidade perdida, parada no tempo, nos confins dos Gerais.


Para se ter uma ideia do movimento de Cruzeiro , a  atração mais cobiçada da cidade é a missa semanal, rezada sempre aos domingos, às dez horas da manhã, ocasião em que  toda a população,  de cinquenta pessoas , comparece à praça principal e única , para a devoção e o passeio, com sua melhor vestimenta , a cuidadíssima      " roupa de missa ".


Destaca-se no desfile da praça: Dona Mirian, a viúva do banqueiro; Cláudia Eugênia, a filha-herdeira, moça donzela e casadoira; o Prefeito, com seu bigodão; a dona Primeira Dama, com seu vestido de grife importado de Paris; e por fim, o Delegado, que é ateu, mas vai a Igreja apenas para mostrar a imponência de sua autoridade.


Faz vista também, a dona Pâmela, bonitona recém chegada à cidade, que dizem ser teúda e manteúda  do coronel Firmino. Bandeou-se para os lados de cá faz pouco, trazendo costumes  e novidades da cidade grande.


Apesar dessa aparente quietude, Cruzeiro Mirim ganhou fama internacional pela produção de um delicioso queijo azul,  fabricado na fazenda  da Dona Isabel, bisneta do coronel Epaminondas, um dos fundadores do local. 


O queijo correu mundo por suas inexplicáveis propriedades afrodisíacas, curativas e rejuvenecedoras  .


Era conhecido pelo nome de  queijo da AVATAR ,o queijo  azul,  de três quilos, vendido inteiro ou em fatias no amazém do "seu" Lindauro, vizinho da botica do "seu" Reginaldo e do lado da bodega do Apolinário e da Dalva, tudo alí na praça.De gosto inigualável ,odor maravilhoso, enfim  uma dádiva  .
O queijo atraía  ainda , muitos turistas que vinham conhecer e provar  o AVATAR . Tinha até gente forasteira de místicas seitas,  que se reunia na praça e entoava uma espécie de mantra ao redor da fonte luminosa. Bem na hora em que começava o esguicho d´agua  e badalavam os sinos da matriz , todos comiam e murmuravam :


hummmmmmmmmmmmmmm,hummmmmmmm,hummmmmmmmmmmmmmmmmm, hummmmmmmmmmmmmm...


Se o queijo fosse gente, já haveria  até pedido de beatificação protocolado no Vaticano, por ordem do Padre José, que, bem rápido, mandou a Sofia, a Secretária da Paróquia, montar uma barraquinha com imagens de santos , tercinhos e garrafinhas de água-benta para  vender aos fiéis do queijo. Sabem como é, as esmolas eram escassas na pacata cidade.


Tinha gente que guardava o queijo na bolsa, igual a relíquia, para durar o ano inteiro e ir comendo aos poucos. Outros, costuravam em pedacinhos de panos como patuá e carregavam na roupa. Outros, ainda, colocavam dentro dos potes de alimentos para a comida render mais.

Vinham excursões de todo o Brasil a procura do queijo  que era raro, pois produzido apenas uma vez ao mês e em um único exemplar. Diziam que  era muito difícil a sua fabricação  porque demandava ingredientes secretos e rituais próprios do AVATAR e daí, a sua preciosidade.

Certa feita, um jornalista, atraído pela fama do AVATAR , foi visitar o lugar e fazer uma reportagem especial sobre o queijo , aproveitando o ibope do filme de  igual nome...

Chegando à cidade, foi à Fazenda de Dona Isabel. Lá , deparou-se com uma cozinha rústica e a velha  nega Fulô,  tataraneta do  escravo Israel, e, hoje, dona das terras, recebidas  em paga de uma indenização trabalhista.


Perguntando sobre a produção do queijo e suas propriedades recebeu a seguinte resposta da Fulô, que continuava sentada num toco de árvore, pitando seu cigarrinho de palha, bem ao gosto mineiro: - Óia seu moço, isso eu num sei dizê não sinhô. O quejo é feito co' o leite da AVA GARDINEY  a TAR  de vaca holandesa  que a Sinhá comprô. A cor azur é do paper crepão qui nóis imbruia o quejo e qui disbota na viage . Pesa treis quilo pruquê nóis só tem um tacho e nóis ponhamos os resto dos leite alí  pra deixá ele azedá e pronto. Ninguém nunca recramô.

Decifrado o mistério, ninguém mais quis saber do queijo, mas, pelas montanhas no entorno da pequena Cruzeiro Mirim, ainda se ouve o eco das vozes do Prefeito, do Padre e do moço do armazém:


- Jornalistazinho filho da  ****...

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